Empatia é um conceito bonito, mas, para muitos de nós, está distante de nossa realidade. Dizer que compreende o que sentimos é arriscar-se em um mar onde nem todos saem ilesos, e os que saem carregam suas mentes transformadas para sempre.
Nossa profissão é vivida com uma exigência que a torna quase um sacerdócio. Somos transformados por ela, dia após dia. Nossa essência muda, nossa visão de mundo se altera, nossos valores são testados e reorganizados constantemente. Vivemos em uma corda bamba entre salvar vidas e, muitas vezes, tirar outras. Mesmo quando fazemos o bem, o mal nos acompanha. Somos personagens paradoxais: heróis e vilões ao mesmo tempo, protegendo algo maior, enfrentando adversidades que nos marcam profundamente.
A presença de nossa farda intimida, mas também causa repulsa, ao mesmo tempo que inspira segurança e revolta. Somos a imagem de um regime que não vivemos, homens e mulheres marcados por trabalhar com o que há de pior na sociedade, lutando contra as mazelas de um povo sofrido.
Cumprimos leis que, para muitos, são apenas relativizadas. Leis que deveriam ser aplicadas por todos, mas que, na prática, são moeda de troca para aqueles que as utilizam em benefício próprio. Somos reféns de interpretações subjetivas e decisões monocráticas de quem deveria defender o sentido original das leis, mas que, muitas vezes, cria incertezas e alimenta um discurso utópico de uma sociedade que nunca existiu – e que, a cada dia, parece mais distante.
Somos taxados, pressionados e desvalorizados por aqueles que detêm o poder sobre nós e nos usam como braço forte.
Nosso cotidiano não nos permite relaxar. Não consigo mais estar em um lugar sem observar todos ao redor, analisando cada pessoa. Caminho preparado para o que vier, mas já não posso andar em qualquer lugar, nem morar em qualquer bairro. Minhas companhias são cada vez mais restritas; minhas palavras, cada vez mais reservadas.
Tenho duas opções: ou carrego toda essa carga e a descarrego em casa, ou a guardo para mim, criando máscaras que lentamente me adoecem com doenças que nem são minhas.
Minha visão endurece. A alegria que antes existia desaparece, e me acostumo com o que, para outros, seria impensável. Vou ao encontro do perigo, sem tempo para lamentar.
Sou fruto de um sistema que rege minha vida, mas que também é usado para me manter sob controle. Vivo em alerta constante, pois, se esquecer quem sou, estarei à mercê de perder minha vida.
Sinto a agonia de estar onde ninguém mais está. Sofro em silêncio e morro esquecido por aqueles que protejo. Tudo isso me adoece.
A sociedade segue nos testando, idolatrando aqueles que vivem à margem da lei, rindo do sistema que lutamos para manter de pé. Assassinos de famílias, de colegas de profissão, pais de família e pessoas de bem desestruturam e destroem a sociedade em nome do dinheiro, do poder e de uma vida de excessos.
Esquecem que o mal é o mal, e combatê-lo consome a alma de quem o enfrenta. Tratam esses criminosos como pessoas comuns, criam narrativas de benevolência e devoção a eles, sem compreender as consequências para suas vítimas e para aqueles que dedicam suas vidas a combatê-los.
Esses indivíduos são como Midas ao contrário – tudo que tocam apodrece. Eles sugam almas, e apenas os mais fortes conseguem resistir e expulsá-los de suas vidas.
Apesar de tudo, ainda sobrevivo e acredito no que faço. Carrego muitos fardos e suportei muitas perdas, mas, enquanto houver força em mim, estarei ao lado da sociedade e das pessoas de bem. Amo o que faço, protejo quem amo e sempre terei repúdio pelo vagabundo, seja ele favelado, doutor, policial, engravatado ou político. Para mim, ele é o lixo da sociedade e, a ele, destino o rigor da lei e a mira do meu fuzil!
Autor: 2° Sgt PMSC RUBIAM